terça-feira, 6 de maio de 2014

Caso 071: Ruptura Catastrófica de um Trocador de Calor (2010).

No momento que um trocador de calor, de quase quarenta anos de idade, estava sendo alinhado para partida da unidade, o casco do equipamento falhou catastroficamente, despejando hidrogênio e nafta altamente inflamáveis provocando uma explosão que ceifou sete vidas (um supervisor de turno e seis operadores). Eles estavam trabalhando nas imediações do trocador de calor e auxiliavam o operador da área na partida da unidade no momento do incidente. O fogo intenso queimou por mais de três horas.

Local da explosão.

O acidente ocorreu em 02 de abril de 2010 na Refinaria Tesoro em Anacortes, no Estado de Washington (EUA), quando uma ruptura rasgou subitamente o casco o trocador de calor E- 6600E da Unidade de Reforma Catalítica/Hidrotratamento de Nafta (NHT).


A - Sala de Operação;
B - Trocadores de Calor do NHT.

A unidade NHT da Refinaria Tesoro Anacortes continha um agrupamento de equipamentos com seis trocadores de calor, divididos em duas baterias paralelas (A / B / C e D / E / F), utilizadas para preaquecer o fluido do processo antes da sua entrada num reator, onde as impurezas eram tratadas para eliminação subsequente. O trocador de calor "E" (E- 6600E) foi construído de aço carbono trabalhava com alta temperatura com nafta a mais de 260 °C.
Os operadores da Tesoro estavam nos estágios finais atividade de arranque (partida da unidade) onde tinham que alinhar um grupo de trocadores de calor (A / B / C) de volta ao serviço após a limpeza interna do feixe tubular. Os trocadores de calor D / E / F (o segundo grupo paralelo) permaneceram em serviço, durante esta operação.
Por causa da longa história da refinaria de vazamentos frequentes e ocasionais incêndios durante esta atividade inicialização o serviço deveria ser classificado como perigoso e não ser tratado como rotineiro tal como era considerado pela administração da refinaria, passando essa “cultura de insegurança”, sendo assimilado erroneamente pela operação.



PARA O MELHOR ENTENDIMENTO SOBRE ESTE 
CASO, VEJA O RESUMO DOS ACONTECIMENTOS NO VÍDEO ABAIXO:




PRINCIPAIS CONCLUSÕES CONFORME A U.S. Chemical Safety Board (CSB)

Falhas de Projeto e de Inspeção

  • A ruptura do permutador de calor E fabricado em aço carbono foi severamente enfraquecido por um mecanismo conhecido como HTHA (Ataque por Hidrogênio a Alta Temperatura). Apesar do trocador de calor B não falhar naquele momento, este também foi igualmente prejudicado pelo HTHA, pois o trocador B tinha as mesmas configurações, confeccionado com os mesmos materiais e operava em condições similares ao outro (trabalhava paralelamente ao trocador E);

Para entender o HTHA
(CLICK AQUI)

Micrografia indicando bolhas que darão
origem as trincas devido a pressão do hidrogênio
contida nessa região.



  • O mecanismo HTHA pode atuar em áreas de alta tensão no aço carbono, como em solda não tratadas termicamente. As soldas dos trocadores de calor B e E (o último falhou catastroficamente) de aço carbono não foram tratadas termicamente. A localização da ruptura do trocador calor E foi ao longo destas regiões de solda de alta tensão; 
  • Em 1970, o American Petroleum Institute (API) publicou uma API Prática Recomendada ( RP ) 941 para aços em serviço com hidrogênio em pressões e temperaturas elevadas em refinarias de petróleo e plantas petroquímicas . Este documento fornece as Curvas de Nelson para prever a ocorrência de HTHA em vários materiais em temperatura e pressão parcial de hidrogênio;
  • As curvas de Nelson são baseadas em incidentes com equipamentos que tiveram falhas no passado e são traçadas com base nas condições do processo que são mal definidas e inconsistentes;
Posicionamento dos trocadores de calor da NHT.
  • Foi realizada pela U.S. Chemical Safety Board (CSB) uma simulação computadorizada das condições de processo dentro do trocadores calor da NHT. Os resultados mostraram que o trecho de aço de carbono do trocador de calor E, que se rompeu, foi considerado pelas Curvas de Nelson como aplicável (valores abaixo da curva). Desta forma, foi considerado seguro para operação sem risco de ocorrência de HTHA. Portanto, a metodologia das Curvas de Nelson para aço carbono é imprecisa, não podendo ser aplicada para evitar falhas em equipamento por  HTHA, pois não foi eficaz para prever este tipo de mecanismo de dano;
  • As partes mais quente dos trocadores de calor B e E eram cladeadas com aço inoxidável, o que melhorou a resistência ao HTHA. Estima-se que esta porção revestida de aço inoxidável operava em condições de processo acima das Curvas de Nelson. No entanto, a porção sem cladeamento (aço carbono) onde ocorreu a ruptura do trocador E, ​​constatou-se que operava abaixo das Curvas de Nelson;
  • É muito difícil de detectar o HTHA através da inspeção de equipamentos. O mecanismo pode ser detectado pela microscopia porém, muitas vezes está presente somente em pequenas áreas localizadas do equipamento.  A identificação bem sucedida do HTHA é altamente dependente das técnicas específicas empregadas e a habilidade do inspetor, e há poucos inspetores que têm essa experiência. Portanto, a inspeção não é suficientemente confiável para garantir a integridade física e impedir o dano do equipamento por HTHA.


Esta micrografia mostra fissuras (1) resultante do HTHA, interligadas
entre si formando uma trinca (2). As regiões "descarbonetadas" (3)
aparecem de cor mais clara (ausência de carbono) 
do que as regiões não afetadas (4).


  • Inspeções no equipamentos e tratamentos térmicos após soldagem dependem de implantação de procedimentos e treinamentos que são considerados baixos na hierarquia de controles e , portanto, não são garantias para evitar falhas por HTHA. É preferível o uso de materiais que não são susceptíveis a danos ao HTHA;
Amostra da secção transversal da solda do trocador de calor da NHT.
A secção transversal de uma passagem múltipla de solda representado
 na macrografia ( imagem superior) foi retirada do permutadores de calor B. 
O esquema do desenho inferior define os termos associados com a solda. 


  • São considerados projetos seguros para se evitar o HTHA  conforme a API os aços  com alto teor de Cr. Os permutadores calor B e E não foram construídos ou totalmente revestidos a partir destes materiais inerentemente mais seguros. 


Falhas de Gestão e de Segurança

  • A partida dos trocadores de calor da NHT era um trabalho perigoso e não rotineiro. Vazamentos constantes apresentavam riscos para os trabalhadores durante as atividades de inicialização. O Process Hazard Analysis (PHA) da refinaria falhou repetidamente não controlando essa situação de risco;
  • Quinze anos antes do incidente de abril de 2010, as premissas utilizadas pelas equipes de PHA na  Refinaria Tesoro Anacortes contribuiu para desfecho catastrófico, a identificação e o controle do perigo foi ineficaz para evitar falhas de equipamentos por HTHA;
  • A Shell Oil (antiga proprietária da refinaria) indicou em seu PHA em 1995 uma relação de modificações no processo que poderiam aumentar a pressão parcial de hidrogênio nos permutadores de calor da NHT . No entanto, durante a gestão destas mudança não levou-se em consideração a avaliação ou recomendações que foram indicadas sobre o potencial do HTHA em danificar este equipamentos; 
  • Shell Oil e a Tesoro realizavam periodicamente relatórios sobre mecanismo de danos e seus riscos a segurança de processo. No entanto não identificaram o HTHA como risco aos permutadores de calor B e E. Esta conclusão encontrada nos relatórios eram falhas, pois baseavam-se principalmente de dados operacionais de projeto, em vez de dados operacionais em condições reais. Essa prática colaborou para entrada de dados incorretos no gráfico das Curvas de Nelson;
A força da explosão, além de romper
o casco com mais de 1" de espessura, dobrou
facilmente o feixe tubular.

  • Procedimentos da refinaria da Tesoro Anacortes, não proibia ou limitava o uso de pessoal adicional durante a inicialização (partida dos trocadores da NHT) apesar de ser perigosa e não rotineira. O procedimento de correto de inicialização especificava o uso de apenas um operador externo para realizar as operações de inicialização. No entanto, no dia do acidente, um supervisor solicitou mais cinco operadores para ajudar com a inicialização dos trocadores B e C;
  • Os trocadores de calor da NHT frequentemente vazavam hidrocarbonetos inflamáveis durante a inicialização, e por vezes, resultando em incêndios. A gestão da Tesoro foi complacente com esses vazamentos e nem sempre investigava a causa dos vazamentos. A Tesoro tomou algumas ações para evitar os vazamentos, mas sem sucesso. Assim foi decidido usar operadores adicionais, durante a inicialização do trocador de calor, para responder aos possíveis vazamentos de hidrocarbonetos ou incêndios. Esta prática  contribuiu para a presença dos seis trabalhadores adicionais na unidade durante o acidente abril de 2010;
Linhas de vapor utilizadas
para amenizar os vazamentos de gases
 através da "supressão da explosividade"
dos gases por diluição.
  • As duas baterias de trocadores de calor da NHT foram projetados em um único bloco, dificultando operar manualmente as válvulas nos diferentes níveis da estrutura dos permutador de calor. Estas válvulas foram utilizadas para iniciar os trocadores de calor e são necessários inúmeros ajustes para manter especificações de temperatura. As dificuldades com a operação da válvula durante a inicialização normalmente resulta na necessidade de assistência adicional de operadores; 
  • A CSB encontrou vários indícios de deficiências de cultura de segurança de processo na Tesoro Anacortes. A gestão da refinaria as considerava as ocorrências de condições perigosas como normais, incluindo vazamentos frequentes dos trocadores da NHT, usando vapor para mitigar vazamentos, ao invés de corrigir problemas de projeto dos trocadores de calor para eliminar os vazamentos. Esse procedimento com vapor exigia mais operadores ao redor dos trocadores durante a partida.


Falhas de Códigos e de Normas

  • Na API RP 941 - Aços para Serviço com Hidrogênio em Pressões e Temperaturas Elevadas em Refinarias de Petróleo e Plantas Petroquímicas não exige que os gestores destas plantas industriais verifiquem as condições operacionais reais ao estabelecer limites operacionais para seleção de materiais que impeçam o HTHA;
  • API RP 941 orienta a indústria a prever a ocorrência de HTHA em diversos materiais de construção, por meio das Curvas Nelson. A criação de tais curvas foi baseada na experiência das indústria sobre o assunto; portanto é puramente empírica, e não há base científica fundamentada. Algumas indústrias de refino de petróleo aplicam erroneamente essas curvas como parâmetro;
  • A CSB tomou conhecimento de pelo menos de oito incidentes em refinarias onde ocorreram o HTHA abaixo das Curvas de Nelson em equipamentos em aço carbono. Em 2011, a API emitiu um alerta sobre o HTHA para as refinarias. O alerta API observou vários incidentes de equipamentos de aço carbono em condições de operação onde previamente acreditava-se que os mesmos eram resistente ao HTHA e que se basearam pelas Curvas de Nelson para manter-se em funcionamento;
  • A CSB descobriu que as Curvas de Nelson para aço carbono são imprecisas e não pode ser invocado para impedir falhas de equipamento por HTHA ou prever com precisão danos ao equipamento por HTHA; 
  • A API RP 941 não exige que a indústria usem materiais mais seguros para evitar falhas por HTHA.



Materiais de Construção do Casco dos Trocadores de Calor da NHT

Trocadores A / D: aço Mn-0,5Mo (SA-302-B), cladeado com aço inoxidável Tipo 304 com 1/8 "de espessura aço;
Trocadores B / E: Aço carbono (SA-515-70), cladeado com aço inoxidável tipo 316 com 1/8 "de espessura, na seção 4 como mostra o desenho a seguir.
Trocadores C / F: Aço carbono (SA-515-70).




Limitações na Estratégia de Inspeção no Caso do HTHA

Enquanto a inspeção é um importante componente do programa de manutenção e integridade física do equipamento, há limitações significativas e o sucesso da inspeção depende exclusivamente de estratégias adotadas para evitar a falha do equipamento por HTHA. Geralmente o HTHA somente pode ser identificado, depois que já houve o primeiro dano por HTHA. A partir daí deve ser monitorado pela inspeção para acompanhar o progresso do HTHA e tentar identificar outros pontos de corrosão no equipamento. Na API RP 941 inclui uma discussão sobre a extrema dificuldade em identificar o HTHA através da inspeção. Veja abaixo alguns pontos elencados:

  • O HTHA é um desafio difícil para a inspeção. Os estágios iniciais das fissuras, pode ser difícil de detectar. O estágio avançado das mesmas com eventuais vazamentos são muito mais fáceis de detectar, mas naquele momento já existe uma maior probabilidade de falha do equipamento;
  • Alguns métodos de controle existentes para tentar identificar o HTHA (micrografia de campo, por exemplo), porém, a inspeção não pode ser o único elemento de confiabilidade para identificar e controlar o HTHA. Os resultados da inspeção podem não ser confiáveis ​​e muitas vezes enganosas; 
  • A identificação bem sucedida do HTHA é altamente dependente das técnicas específicas empregadas e da habilidade do inspetor, e poucos inspetores têm este nível de especialização; 

  • O mecanismo pode ser eliminado em projeto inerentemente mais seguros utilizado materiais mais resistentes ao HTHA, tais como os aços inoxidáveis da série 300, bem como ligas com 5% a 12% de Cr. Em condições observadas, normalmente em unidades de refinação, estes materiais não foram suscetíveis ao HTHA.
Fonte:

 U.S. Chemical Safety Board (CSB)

Explanação e anotações das aulas dos professores Luiz Antonio Bereta e Maurício de Oliveira nas disciplinas 
"Causas de Deterioração de Equipamentos" e "Soldagem" , respectivamente, da Equipe de Formação Industrial – EFI / SINDIPETRO-LP.

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