segunda-feira, 17 de junho de 2013

Caso 020: As Falhas de Flixborough (1974).

Sábado, 01 de junho de 1974, na pequena cidade de Flixborough, no condado de Humberside, região nordeste da Inglaterra, uma violenta explosão na planta de produção de caprolactama na fábrica Nypro Factory Ltda., seguindo de um grande incêndio, destruiu totalmente suas instalações fabris.

A direita da foto e na sequência, os reatores 01,02 e 03.

Pouco mais de 1.800 habitações e cerca de 167 estabelecimentos comerciais num raio de 13 quilômetros do local foram danificados.
Incêndios resultantes da explosão assolaram a área por mais de 10 dias.
O número de mortos chegou a 28 sendo que destes, 18 trabalhadores morreram no centro de controle de operação, devido ao colapso da edifício. Mais de 104 pessoas ficaram feridas.
A catástrofe poderia ser maior se o acidente ocorresse durante a semana onde o número de vítimas poderia passar de 500.


Esta explosão foi considerada a maior em tempos de paz após a II Guerra Mundial, em território inglês, até a explosão Buncefield Depot em 2005 (Ver Caso 009 clicando AQUI).
Estima-se que a força liberada pela explosão foi equivalente a cerca de 30 toneladas de TNT.

O que é caprolactama ? Click AQUI

COMO O ACIDENTE ACONTECEU...

Havia seis reatores em série, cada reator em nível mais baixo que o antecedia, permitindo o fluxo por gravidade do reator 01 ao 06, através de curtos tubos de conexão de 28" . Para permitir a dilatação térmica, cada conexão tinha uma junta de expansão.

Foto retirada antes da remoção do Reator 05.

Conforme a conformação espacial no desenho abaixo, o reator 05 foi retirado do local devido uma trinca originária de uma modificação do processo (refrigeração externa com água). Em seu lugar, foi instalada uma tubulação temporária de 20", com dois cotovelos devido à diferença de nível. As juntas de expansão existentes foram mantidas em cada extremidade da tubulação temporária.
Com o intuito de retornar a produção o mais rápido possível, a nova e provisória tubulação não foi testada antes de reiniciar a operação da planta, e assim, não foram considerados normas de projetos , as limitações para as modificações no processo e sequer foram seguidas as recomendações do fabricante.
Após dois meses de operação a falha ocorre. Uma ruptura na tubulação de 20" foi atribuída a um projeto mal elaborado, uma vez que a estrutura instalada para a sustentação do duto (sustentação feita precariamente com andaimes), não suportou a sua movimentação, em função da vibração a que o tubo foi submetido durante a operação.
O rompimento da linha liberou cerca de 50 toneladas de ciclohexano a 150°C, que vaporizou-se e originou uma nuvem inflamável que logo encontrou uma fonte de ignição (provavelmente num forno da fábrica de produção de hidrogênio vizinha a planta). A explosão foi ouvida a 25 quilômetro de distância.


A linha provisária era sustentada por andaimes.

No momento da explosão a fábrica tinha aproximadamente um estoque de substâncias perigosas de:
  • 1.250.000 litros de ciclohexano;
  • 250.000 litros de nafta;
  • 42.000 litros de metilbenzeno;
  • 100.000 litros de benzeno;
  • 1.700 litros de gasolina.

ORIGEM DO PROBLEMA – MODIFICAÇÃO DO PROCESSO

Como em tantas outras fábricas mundo a fora é "comum" aspergir água sobre equipamentos que estão superaquecendo ou deixando escapar fumos.
Não foi diferente nesta fábrica da Nypro , onde o reator 05 da planta de produção de caprolactama iniciou um vazamento de ciclohexano vaporizado através da caixa de gaxeta do agitador de topo do reator. Para minimizar a evolução de vapores inflamáveis, a equipe de operação local alinhou uma mangueira para despejada água no topo do reator, utilizando a tomada de água mais próximo disponível como "água de refrigeração" .
Porém, todos ignoravam que essa água continha nitratos que causaram corrosão sob tensão (click aqui) no reator fabricado em aço-carbono (revestimento interno de aço-inoxidável) e consequentemente o aparecimento de uma trinca no aço carbono. Dessa forma, o reator foi removido para reparos e substituído temporariamente pela tubulação de 20" (a mesma que rompeu dois meses depois).



A CORROSÃO POR NITRATOS PODERIA SER EVITADA?

A corrosão em aço-carbono por nitratos seguido de trinca, é bem conhecida pelos metalurgistas e especialistas, mas naquela época não era bem compreendida pelos engenheiros encarregados pela operação da planta. Antes de despejar água em um equipamento, exceto em emergências, por que não perguntar o que ela contém e o que poderá causar ao equipamento?
A aspersão com água é um procedimento fora da operação normal, devendo ser tratada como uma modificação de processo e/ou projeto.

Esse episódio é conhecido como "O Desastre de Flixborough".

FALHAS DE PROJETO

  • O projeto dessa tubulação e seu suporte deixaram muito a desejar, pois ela não estava exatamente sustentada, apenas apoiada por andaimes. Embora, havia juntas de expansão em cada extremidade, o tubo podia oscilar, torcer ­se e vibrar quando a pressão excedia um pouco os níveis normais. Isto provocou rompimento da tubulação.
  • Na ocasião em que a tubulação foi projetada não havia engenheiro qualificado na planta. O profissional que a projetou e construiu não tinha experiência com tubos de grandes diâmetros, operando em temperatura (150°C) e pressão (10 kg/cm2) elevadas. Poucos engenheiros têm conhecimento especializado para projetar tubulações submetidas a altas tensões. Além disso, os engenheiros de Flixborough não consideraram necessário um projeto realizado por especialistas. Eles não tinham ideia do quanto não sabiam.



QUAIS AS LIÇÕES FORAM APRENDIDAS?

Num prazo de 10 anos a maioria dos funcionários de uma determinada unidade fabril ou departamento terá mudado. Manter e melhorar a memória corporativa para evitar a repetição do desastre ou ocorrências similares não é uma tarefa simples e exige medidas apropriadas. Em geral as lições são esquecidas e os acidentes se repetem.
Todo sistema corporativo para gerenciamento de segurança deveria prever que:

  1. Toda modificação deve ser controlada e documentada através de procedimentos oficiais;
  2. Todos os gerentes, sem exceções, devem empreender algum tempo andando pela área fabril, à espreita de situações anormais;
  3. As empresas devem ter um quadro suficiente de profissionais com a qualificação profissional correta e a experiência necessária para detectar e avaliar equipamentos e suas intervenções (inspeção);
  4. As plantas devem ser planejadas de forma a evitar o efeito dominó ou minimizar a propagação de acidentes e ocorrências perigosas internas;
  5. Prédios ocupados localizados próximos de plantas perigosas devem ser projetados para resistir a um determinado nível de sobrepressão externa. Prédios administrativos devem preferencialmente ser afastados ou protegidos do processo fabril;
  6. Apenas aqueles funcionários, cuja presença é absolutamente essencial para manter uma operação segura, devem ser mantidos em área perigosas, porém cuidadosamente protegidos.
Assista o vídeo no link abaixo (imagens feitas pela BBC de Londres):




Fonte:

Loss Prevention in the Process Industries por Frank P. Less
Center for Chemical Process Safety - CCPS
FLIXBOROUGH – 25 ANOS por P. E. Pascon
www.zonaderisco.blogspot.com.br
www.cetesb.sp.gov.br

2 comentários:

  1. Interessante notar que na verdade o que causou a falha foi a incorreta suportação e fixação do sistema provisório. A junta de expansão axial libera força de reação por pressão, que não foi contida adequadamente através de suportação. Se houvesse um ponto fixo no trecho inclinado corretamente dimensionado e guias próximas às juntas como recomendação dos fabricantes, seria evitado este acidente. Sistemas que utilizam juntas de expansão exigem projeto formal.

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  2. Excelente texto, precisava dele para minha aula de segurança de processos, muito obrigada!

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